A paixão é um veneno da mente. Por conta dela, ampliamos a
imagem de uma pessoa, tornando-a mais importante do que ela realmente é.
Esta pessoa por quem nos apaixonamos não é ela mesma. Não passa de uma
perspectiva projetada de nossas fantasias. Para 99,99% da humanidade, a
tal pessoa não tem importância alguma. E é tão relevante para o ser
apaixonado, mas não tem relevância além daquela criada pelos mecanismos
da fantasia. E é por isso que a paixão sempre estará abaixo do amor e
nunca lhe chegará aos pés. Porque a paixão trata de fantasia, e o amor,
de realidade.
Porque apaixonar-se é sempre por causa de:
por causa da beleza do outro, por causa de sua inteligência ou de várias
características sedutoras que o outro apresenta. E amar, ao contrário, é
sempre apesar de. Amamos alguém apesar de seus defeitos, apesar de
conhecermos seus lados mais sombrios. O amor enxerga, e muito bem. Quem
sofre de cegueira é a paixão.
Apaixonar-se é
absolutamente natural, e mais natural ainda é que esta paixão dê lugar
ao amor na medida em que o tempo passe e aquela pessoa perfeita se
converta naquilo que ela efetivamente é: uma pessoa. Isso quando a
paixão é correspondida e é saudável. Insistência em paixões
infuncionais, apego por quem nos faz sofrer, essas coisas não têm nada
de amor e têm tudo de imaturidade ou, em alguns casos, têm a ver com
desejo de autodestruição.
Não escolhemos por quem nos
apaixonamos. Mas escolhemos dar corda para isso. E quando a paixão se
revela destrutiva como uma doença, o tratamento é evidente: afastar-se
do que nos causa mal é prerrogativa inicial básica para o retorno a um
estado centrado. Em seguida, procurar trazer as projeções e expectativas
passionais à luz da análise pode ajudar a mudar nosso gosto, permitindo
que nos apaixonemos por pessoas melhores. Gosto é uma coisa que se
refina com o tempo e com boa vontade. Assim é na música, na literatura,
na culinária, e nos relacionamentos humanos não é diferente. A paixão é
uma parte nossa, mas não somos nós. E jamais, nunca deveria ser a força
mais poderosa a nos guiar a vida. Aliada à paixão devem vir as
considerações racionais. E quem acha que uma coisa exclui a outra ou
ainda está na adolescência, ou precisa de uma educação para a vida, de
uma efetiva educação filosófica que lhe permita ir além deste falso
cenário em que as coisas ou são da paixão ou são da razão. Afinal, é do
contraste e da dança paixão-razão que brota a vida em sua forma mais
plena e bem vivida.
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